sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Em 2008, disputas de Florianópolis desembocam no plano diretor

UOL ; Antonio Biondi ; 25/1/2008

Florianópolis deve votar em 2008 seu novo plano diretor (a lei que traz as diretrizes para o desenvolvimento e urbanização do município nos próximos anos). Os painéis dos ônibus anunciam os debates; universidade, entidades e bairros se mobilizam para afirmar o a cidade que desejam; os moradores se organizam para compartilhar e colocar frente a frente suas expectativas quanto ao futuro de Floripa.

A Prefeitura confere a organização do processo do plano a Ildo Rosa, diretor-presidente do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf). Segundo ele, "a perspectiva é encaminhar isso no primeiro semestre de 2008 à Câmara dos Vereadores. O calendário eleitoral não pode parar a cidade". Para o diretor do Ipuf, "o plano atual foi realmente comprometido, com mais de 350 alterações. Projetou-se uma cidade com 1,5 milhão de habitantes, algo incompatível com a realidade da Ilha, que tem dificuldades no abastecimento de água, de luz, de saneamento". A expectativa, segundo ele, é de "uma luta bastante renhida", mas também de ": um plano mais restritivo, cidadão e humano".

Paulo Benincá, analista ambiental do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), trabalha na Estação Ecológica de Carijós, no Norte da Ilha. A região preserva importantes faixas de restinga, manguezais, de inúmeros representantes da flora e fauna locais. Em outras partes da cidade, contudo, as antigas áreas de manguezal, berço de aves, peixes e crustáceos, vão dando lugar a grandes empreendimentos, como shoppings, condomínios, etc.

Para o analista do Ibama, "o grande problema ambiental de Florianópolis é político". Benincá avalia que "existe um voluntarismo instalado no Ipuf de fazer um plano participativo". Ele conta ter participado por dois anos do Plano de Desenvolvimento Integrado de Cacupé, Santo Antonio e Sambaqui (Norte da ilha). Na elaboração da proposta, após estabelecidas as restrições ambientais, o plano seguiu para o setor de estrutura viária e definição dos gabaritos de edificações e taxas de ocupação: "onde se previa 16 mil moradores, propuseram 45 mil!". Benincá questiona "quem dará as cartas finais no novo plano" e "quem paga a campanha de quem" nas eleições de 2008.

Em meio ao agitado clima da cidade, a Câmara dos Vereadores reflete os conflitos e perspectivas quanto ao futuro da capital catarinense. No entender de Márcio de Souza, vereador do PT em Florianópolis, os efeitos do plano diretor não podem ser supervalorizados. Para o petista, "mesmo que as antigas oligarquias sigam trabalhando pela manutenção de seu poder e lucros, se engana quem pensa que isso se perpetuará. Há forças silenciosas em movimentação e um povo que se organiza, em processo de emancipação".

Segundo Telma Piacentini, professora aposentada da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), "o Campeche [Sul da Ilha] é o local de maior resistência na Ilha à imposição do projeto desenvolvimentista". Ela conta que, na década de 1980, casas recém-construídas lançavam seu esgoto diretamente no mar e que os surfistas, pescadores e moradores mais antigos reagiam, entupindo os canos de esgoto das novas casas com jornais. Com isso, a construção de fossas tornava-se praticamente obrigatória aos novos moradores.

De acordo com Telma, nos anos 1990 projetava-se um Campeche com mais de 200 mil habitantes. Seriam construídas duas grandes vias expressas, uma sobre as dunas. "Barramos o projeto". Embora entenda que, "a expressão mágica para o prefeito e o governador é 'grande capital internacional'". Telma acredita que seja possível desenvolver o Campeche e Floripa "em uma perspectiva positiva e dentro da sua vocação", simbolizada, entre outras coisas, por suas casas sem muro e pelo projeto de leitura passeando em barcas na Lagoa da Conceição.

As perspectivas de Helio Bairros, presidente do Sinduscon de Florianópolis (entidade patronal da construção civil), se aproximam tanto quanto se chocam às de Telma. Bairros destaca que "não temos um modelo, não temos regras, que dêem sustentabilidade à cidade", ressaltando que se multiplicam hoje no município as construções sem projeto, alvará e habite-se.

Para o presidente do Sinduscon, os planos Diretor, de ordenamento náutico e de gerenciamento costeiro são fundamentais para que "Florianópolis exerça sua vocação natural, especialmente em relação ao turismo de alto padrão", com a implementação "de piers, marinas, campo de golf e um porto turístico" e fazendo da cidade uma referência "em termos de turismo, preservação ambiental e geração de renda e empregos qualificados".

Na subida do Mont Serrat, uma das comunidades carentes localizadas no Maciço do Morro da Cruz (região central), as estruturas da centenária ponte Hercílio Luz se confundem no horizonte com os fios dos "gatos" de energia elétrica. A subida do morro, mal servido de ônibus e outro serviços básicos, impressiona tanto quanto a bela vista.

O Padre Wilson Groh, que há mais de 30 anos desenvolve projetos nas comunidades da região, lembra que "a riqueza atrai a pobreza" e conta que "em 70, 80, veio muita gente do interior. A partir de 90, começou a vir gente de todo o Brasil". O padre explica que "em todas as pontas de morro, todos já ocupados, não tem água, saneamento, luz.

Por outro lado, há quem more em Jurerê Internacional e trabalhe em São Paulo". Ele se pergunta se "Florianópolis é a Ilha da Magia para todos seus habitantes", destacando que os condomínios e edifícios de luxo se multiplicam às dezenas na cidade, em ritmo só superado pelo das moradias precárias de baixa renda. "O plano diretor reflete esse dilema das duas cidades. Floripa é suscetível aos grandes empreendimentos, mas como trabalhar essa cidade com as outras?", finaliza.

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